Decreto 9193 - 30 de Dezembro de 2010


Publicado no Diário Oficial nº. 8374 de 30 de Dezembro de 2010

Súmula: Decreta a suspensão liminar e provisória dos efeitos de demissão imposta à jornalista VALÉRIA BASSETTI PROCHMANN do cargo de Profissional de Comunicação da Companhia Paranaense de Energia – COPEL.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO PARANÁ, no uso das atribuições previstas nos arts. 83 e 87, da Constituição do Estado do Paraná, e com fundamento na Súmula 473, do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual "a Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos", e considerando os termos de requerimento formulado no Protocolado Administrativo n. 10.766.467-0, RESOLVE exercer juízo cautelar liminar em relação ao ato de demissão ditado pela Companhia Paranaense de Energia – COPEL à jornalista Valéria Bassetti Prochmann do cargo de Profissional de Comunicação, como passa a expor.
1. Trata-se de petição administrativa na qual requer a jornalista VALÉRIA BASSETTI PROCHMANN (1) a suspensão, em caráter cautelar liminar, dos efeitos de despedida política, afirmada assim ilícita, que lhe foi imposta do cargo de Profissional da Comunicação da COPEL; (2) a reintegração provisória no cargo em referência; e (3) que condicionada a reintegração definitiva e os efeitos patrimoniais pretéritos a que formule, em 30 dias a contar da publicação do decreto de reintegração liminar, pedido de revisão administrativa do ato demissório, a tanto fundamentando, em síntese, haver sido sujeitada a práticas de perseguição política tanto ao ser despedida, quanto depois ao ser-lhe movida rescisória como ardil para, na prática, uma nova despedida política.
Distribuído o feito a exame da Procuradoria-Geral do Estado e da Diretoria Jurídica da COPEL, e para propor rejeição do pedido formulado, ponderaram seus titulares no entorno da competência para a prática do ato postulado e da coisa julgada.
É o relatório. Passo a decidir.
2. Na ordem jurídico-constitucional, desempenha o Chefe do Poder Executivo a função de controle hierárquico de todos os atos da Administração Pública Direta e Indireta, de forma que, se lhe chega a notícia de possível ilícito em qualquer órgão ou entidade, é de seu dever coarctar a ilegalidade, em caráter cautelar ou definitivo.
Certo, ainda, que inexiste coisa julgada no caso ora examinado, na medida em que há ação rescisória proposta pela jornalista requerente destinada a desconstituir o acórdão havido na rescisória proposta pela COPEL e, além disso, abrange a ação rescisória proposta pela jornalista requerente a tese de despedida política, que, à vista dos autos administrativos submetidos a exame, é matéria ainda não examinada pelo Poder Judiciário.
O processo administrativo é governado por leis próprias e, subsidiariamente, pelas leis de direito processual penal e de direito processual civil. A possibilidade de tutelas cautelares, liminares, antecipatórias em qualquer dado processo – civil, penal ou administrativo – é elementar em direito. O substrato legal para tutelas da espécie no processo administrativo inscreve-se no âmbito do poder-dever de autotutela da Administração, já que não faria sentido pudesse existir um dado perigo contra a Administração, a sociedade ou o cidadão e nada pudesse fazer a Administração em caráter imediato e de urgência. No processo administrativo disciplinar, exerce o Estado a posição de Estado-Juiz, de forma que, para desempenho de seus poderes disciplinares, dispõe de variada gama de poderes. Suspender contratos, suspender o efeito de atos, suspender o exercício de direitos ou funções constituem o quotidiano da Administração. Logo, não há dizer de falta de previsão legal para medidas cautelares ou tutelas antecipatórias no processo administrativo.
O processo administrativo disciplinar diz com os direitos civis e políticos e, pois, se lhe aplica o art. 796, do Código de Processo Civil, em linha de que "o procedimento cautelar pode ser instaurado antes ou no curso do processo principal e deste é sempre dependente". É aplicável ao processo administrativo disciplinar, ainda, o art. 273, do Código de Processo Civil, no sentido de que pode o Estado-Juiz, "a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial". Fosse insuficiente, e há ainda a previsão do art. 45, da Lei de Processo Administrativo Federal (Lei n. 9.784/99), que subsidiariamente se pode aplicar nas lacunas do direito estadual, no sentido de que, "em caso de risco iminente, a Administração Pública poderá motivadamente adotar providências acauteladoras sem a prévia manifestação do interessado".
No caso concreto, há pedido liminar em processo preparatório de futuro processo principal de natureza revisional, que assim pode ser processado e julgado como contendo, a um só tempo, natureza cautelar para proteger os interesses objeto de futuro processo e de tutela antecipatória do próprio provimento definitivo que se requererá em processo revisional futuro.
Aplica-se ainda ao caso a Súmula 473, do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que "a Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos".
Recebo, pois, a petição administrativa deduzida pela jornalista VALÉRIA BASSETTI PROCHMANN como contendo pedido liminar destinado a proteger os interesses públicos primários (da sociedade), secundários (da Fazenda Pública) e individuais (da requerente), e bem assim para proteger os interesses da própria carreira de Jornalista, seriamente ameaçada que está em sua autonomia e independência pelos fatos noticiados nos presentes autos. Nesse contexto, passo então a examinar a presença dos requisitos do pedido liminar.
3. Os pedidos liminares apresentam, em comum, os requisitos de relevância jurídica do direito postulado e de risco de dano na hipótese de eventual postergação. No requisito relevância jurídica do direito estão contidos os conceitos de plausibilidade, verossimilhança, prova inequívoca. Já na dimensão risco de dano, há o conceito de proteção imediata de interesses processuais ou materiais.
Os fatos relevantes e incontroversos nos autos administrativos examinados são os seguintes: (1) a jornalista requerente foi contratada pela COPEL em razão da aprovação em 2º. lugar em Concurso de Provas e Títulos; (2) desempenhou regularmente o cargo, com realizações internas compatíveis com seu histórico funcional e profissional, inexistindo nos registros formais da companhia quaisquer registros negativos; (3) sem justa causa, foi demitida em 15.4.1999, sendo fato notório nos meios políticos que ditada a demissão à jornalista requerente por razões políticas estranhas ao interesse público; (4) contra referida demissão, ajuizou reclamação trabalhista sustentando duas teses fundamentais: a de que a demissão se deu por motivos políticos, já que, na visão das autoridades da época, a jornalista requerente estaria esta vinculada às forças de oposição, e a tese de que, sendo concursada, somente poderia ser demitida após devido processo administrativo; (5) foi reintegrada judicialmente pelo Tribunal Superior do Trabalho com fundamento exclusivo na segunda tese, isto é, de que, sendo concursada, somente poderia ser demitida após devido processo administrativo, de forma que, havendo aí fundamento suficiente, a tese de despedida política não foi apreciada pelo TST; (6) ao ascenderem ao poder as antigas forças de oposição, às quais na lógica das antigas autoridades estaria ligada a jornalista requerente, veio esta, de forma insólita, a sofrer ação rescisória proposta pelo novo governo; (7) é fato notório, ainda, que tal ação rescisória foi proposta contemporaneamente às investigações e denúncias contra atos de responsabilidade dos então dirigentes da COPEL promovidas por Procurador de Estado historicamente vinculado ao campo político-ideológico de atuação da jornalista requerente, daí, pelas circunstâncias de tempo, lugar e pessoas, conformar-se quadro inequívoco de desvio de poder no manejo de referida ação rescisória; (8) com base em tais fundamentos, há agora ação rescisória proposta pela jornalista requerente em trâmite perante o TST (Autos de Ação Rescisória de Rescisória n. 2061206-44.2009.5.00.0000).
Presente, pois, o requisito relevância do direito a ser acautelado.
Já em relação ao requisito risco de dano irreparável, constato a presença dos seguintes riscos justificadores da tutela de urgência postulada: 1º) risco contra a carreira de Jornalista, na medida em que, por força de tal precedente da jurisprudência administrativa, e enquanto não levantados e cessados seus efeitos, é seriamente ameaçada em sua missão institucional; 2º) risco contra a COPEL, e assim contra o Estado que é seu controlador, na medida em que a cada dia cresce o passivo que terá de suportar por conta de tal despedida política, já que de grau certo a probabilidade de desconstituição em futuro processo revisional; 3º) risco contra a jornalista requerente, que, fora do cargo, tem reduzida sua condição de posicionar-se em devido processo administrativo revisional.
3. Sensibiliza-me, ademais, a fundamentação trazida pela jornalista requerente relacionada a que a atividade de jornalismo na Administração Pública Direta e Indireta está vinculada a princípios constitucionais sensíveis, assim entendidos os concernentes ao direito da sociedade à informação, à transparência, ao regime democrático, à forma republicana de governo, à liberdade de imprensa, pensamento, expressão e comunicação, ao pluralismo político, à inviolabilidade de consciência, à prevalência dos interesses públicos sobre os interesses das autoridades, à publicidade, moralidade e probidade enquanto pressupostos de validade dos atos governamentais.
Sensibiliza-me, ademais, a argumentação de que o instituto da demissão sem justa causa não se presta a ocultar motivo ilícito ou ato que tenha por objetivo fraudar lei imperativa (art. 166, incs. III e VI, do Código Civil) e de que, embora se tenha afirmado sem justa causa, constitui fato notório nos meios políticos paranaenses a existência de causa oculta ilícita a motivar a demissão imposta à jornalista, de natureza estranha e incompatível com os interesses públicos da companhia e da sociedade.



DECRETA:

Art. 1º. Fica decretada a suspensão liminar provisória dos efeitos do ato de demissão da jornalista VALÉRIA BASSETTI PROCHMANN do cargo de Profissional de Comunicação da Companhia Paranaense de Energia – COPEL.

Art. 2º. O provimento administrativo liminar de reintegração ora decretado apresenta efeitos exclusivamente futuros e estará automaticamente revogado se inexistente pedido administrativo de revisão do ato demissório no prazo máximo de 30 dias, a contar da data de publicação deste decreto.

Art. 3º. Os efeitos funcionais e patrimoniais pretéritos, de natureza previdenciária, indenizatória ou de qualquer outra origem legal condicionam-se a eventual deferimento futuro em revisão do ato demissório.

Art. 4º. Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Curitiba, em 30 de dezembro de 2010, 189º da Independência e 122º da República.

 

Orlando Pessuti
Governador do Estado

Ney Caldas,
Chefe da Casa Civil


Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial do Estado