Decreto 9124 - 27 de Dezembro de 2010


Publicado no Diário Oficial nº. 8371 de 27 de Dezembro de 2010

(Revogado pelo Decreto 429 de 07/02/2011)

Súmula: Reintegra André Renato Miranda de Andrade no cargo de Procurador do Estado do Paraná e dá outras providências.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO PARANÁ, no uso das atribuições previstas nos arts. 83 e 87, da Constituição do Estado do Paraná, e com fundamento no art. 5º, inc. XXXIV, da Constituição Federal, art. 261, inc. II, do Estatuto dos Servidores Públicos do Estado do Paraná (Lei Estadual n. 6.174/70), arts. 65, parágrafo único, e 82, do Estatuto dos Procuradores do Estado do Paraná (Lei Complementar n. 40/87), e demais dispositivos legais aplicáveis, RESOLVE receber como pedido de reconsideração o requerimento objeto do Protocolado n. 10.693.819-9 em relação ao contido no Processo Administrativo Disciplinar objeto do Protocolado n. 9.535.607-9 e no Decreto Estadual n. 3.344, de 27 de agosto de 2008, como passa a expor:
01. Trata-se de petição deduzida por ANDRÉ RENATO MIRANDA DE ANDRADE na qual se requer a decretação de nulidade absoluta do processo administrativo disciplinar objeto do Protocolado n. 9.535.607-9 que lhe impôs a pena de demissão do cargo de Procurador do Estado do Paraná por alegado abandono de função e sua reintegração em referido cargo.
Relata que, por problemas médicos, não pôde acompanhar o processo administrativo disciplinar, que a instrução do processo ocorreu à sua revelia, sem apresentação de defesa e sem exercício de contraditório. Invoca, para fundamentar a tese de nulidade, o art. 82, da Lei Complementar 40/87, cuja redação é a seguinte: "Art. 82, LC 40/87. Ao indiciado revel será concedido defensor, designado pelo Presidente da comissão de processo administrativo."
02. A ausência de defesa no processo é fato incontroverso nos autos e encontra-se reconhecida tanto no relatório emitido pela Comissão de Processo Disciplinar (fl. 110), quanto agora no parecer de lavra da Coordenadoria Técnico-Jurídica da Casa Civil, onde se lê o seguinte (fl. 152): "De fato, feita a análise de todo o processado, pertinente é a nulidade suscitada, em que pese a citação pessoal do requerente nos autos de Processo Administrativo (fls. 53), o mesmo não compareceu nos autos para defesa, tornando-se revel, ocasião em que deveria ter sido nomeado defensor dativo, nos termos do art. 82 do Estatuto da Procuradoria Geral do Estado."
É o relatório. Passo a decidir.
03. Recebo o requerimento formulado por ANDRÉ RENATO MIRANDA DE ANDRADE como pedido de reconsideração, e faço com fundamento no art. 5º, inc. XXXIV, da Constituição Federal, e no art. 261, inc. II, do Estatuto dos Servidores Públicos do Estado do Paraná (Lei Estadual n. 6.174/70),.
O reconhecimento de nulidade absoluta não reclama forma ritual específica, e pode ocorrer a qualquer tempo, independentemente, inclusive, de requerimento do interessado. Nesse sentido, a Súmula 473, do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que "a Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos".
É inválida, portanto, a idéia de que a nulidade absoluta somente poderia ser reconhecida por meio de processo administrativo revisional.
A falta de defesa em processo administrativo de caráter disciplinar – na constelação de nulidades – é a mais grave e é insanável, na medida em que, sem defesa, não há processo. No caso concreto, o acusado não constituiu advogado, o Estado não lhe nomeou defensor, nem compareceu o acusado perante o Estado, tampouco consideraram as autoridades processantes e a autoridade sentenciante fatos que em tese seriam suscitáveis pela defesa.
A inobservância dessa regra básica, elementar em tema de processo disciplinar abre um risco de passivo considerável contra o Estado, já que, se no futuro reconhecesse o Judiciário ou a própria Administração a nulidade, como em condições normais tenderiam a reconhecer, os efeitos patrimoniais em favor do requerente retroagiriam para desde a data da demissão, contando-se já agora quase 30 meses desde a demissão, em situação que se acumula dia a dia.
Nesse contexto, é preciso enunciar a solução justa para o caso, que, de um lado, proteja o Estado de referido passivo e, de outro, dê ao direito do requerente tratamento compatível com a ordem jurídica.
A pura e simples decretação de nulidade do processo não resolve a lide, porque abriria contra o Estado referido passivo e manteria o requerente sujeitado a novo processo, quando, no caso, pelos elementos disponíveis, é possível desde logo decidir a matéria. Assim, e considerando que não se deve decretar a nulidade quando possível decidir do mérito em favor da parte a quem aproveitaria a nulidade (art. 249, § 2º, do Código de Processo Civil) e que a regra em matéria de processo de qualquer natureza é a de aproveitamento dos atos, passo a examinar a questão de mérito, relativa à imputação de abandono de função.
04. No relatório da comissão processante e no decreto demissório, invoca-se como causa de decidir que as faltas do requerente ao serviço traduziriam abandono de função, mas o fato é que inexiste consideração no relatório e no decreto demissório quanto a possíveis outras tantas hipóteses determinantes de referidas faltas, como, por exemplo, os problemas médicos a que se refere o requerente na fl. 130, que o teriam afastado do serviço público e que seriam de conhecimento público na Procuradoria.
Há ainda relato no processo de que o requerente contava 17 anos de serviço público e de que, tendo ingressado na Procuradoria em 07/03/1990 (fl. 110), passou a incidir em faltas em 2007 (fl. 99), inclusive tendo sido apenado com desconto de faltas e afastamento.
Há a hipótese suscitada pelas autoridades de abandono de função, mas, em contraste, há outras hipóteses mais prováveis e compatíveis com a prova dos autos, que, de forma contrária à ampla defesa e ao contraditório, não foram consideradas nem sopesadas pelos acusadores.
A pena de demissão é a pena máxima no serviço público, e na sua aplicação não há espaço para automatismos. Por ser a máxima, a pena de demissão só tem lugar quando tenham sido esgotadas as possibilidades de absolvição e quando, remanescendo juízo condenatório, se tenham revelado insuficientes as demais penas previstas no ordenamento jurídico.
No caso concreto, as autoridades não esgotaram as possibilidades de absolvição, nem consideraram as demais penas possíveis.
A hipótese de puro e simples abandono de função não é compatível com o histórico anterior do requerente de 17 anos de serviços prestados, e o mais provável – com base na experiência subministrada pela observação do que ordinariamente acontece nas corporações (art. 335, do Código de Processo Civil) – é que o requerente tenha de fato vivenciado os problemas médicos suscitados em seu requerimento e que estes seriam de conhecimento geral da procuradoria, tanto assim não contraditadas tais argüições no parecer de fls. 149/150, de lavra da Procuradoria-Geral do Estado.
Enfim, deixaram de considerar as autoridades processantes e de sentenciamento que o absenteísmo imputado ao requerente – à luz do histórico de 17 anos de serviços prestados à Procuradoria – evidencia não um fenômeno de natureza individual, mas, sim, fenômeno contemporâneo de larga ocorrência nas corporações públicas e privadas, associado a patologias nas dinâmicas de trabalho e aos efeitos disso em pessoas que se encontrem vulneráveis.
As regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece no mundo corporativo contemporâneo desautorizam o decreto demissório, inclusive porque, se aplicada a demissão à hipótese de autos, deixaria de existir pena compatível e suficiente no ordenamento jurídico para outros tantos fenômenos corporativos de maior grau de reprovabilidade e censurabilidade.
05. Entendo, por outro lado, que, para a indeterminação quanto ao real motivo das faltas e para o erro de fato e de direito em que incorreram as autoridades, concorreu de certa forma o próprio requerente, inclusive ao deixar de requerer afastamento para tratamento de saúde, de forma que, por tais fundamentos, e considerando ainda a natureza do fato objeto de imputação, as circunstâncias, a gravidade e as conseqüências (art. 65, parágrafo único, da Lei Complementar n. 40/87), concluo que o período de afastamento do requerente – e as conseqüências gravosas que daí lhe advieram (perda de vencimentos, cessação das contribuições previdenciárias e dos direitos correlatos, abalo de prestígio, interrupção do próprio exercício das funções) – constituem apenamento mais que suficiente para aplacar e satisfazer qualquer pretensão estatal condenatória porventura ainda remanescente.
A pretensão punitiva estatal encontra limites nas medidas de razão e proporção, e por tais limites que decido pronunciar a reintegração do requerente com efeitos exclusivamente de agora para o futuro, de forma que o período de afastamento do requerente não dará direito a cômputo para fins previdenciários, nem a nenhum outro direito patrimonial pretérito.
 
DECRETA:

Art. 1°. Fica decretada a reintegração de ANDRÉ RENATO MIRANDA DE ANDRADE no cargo de Procurador do Estado do Paraná.

Art. 2°. A reintegração ora decretada produzirá efeitos exclusivamente para o futuro e o período de afastamento do procurador reintegrado não dará direito a cômputo para fins previdenciários, nem a nenhum outro direito patrimonial pretérito.

Art.3°. Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Curitiba, em 27 de dezembro de 2010, 189° da Independência e 122° da República.

 

Orlando Pessuti
Governador do Estado

Ney Caldas,
Chefe da Casa Civil


Este texto não substitui o publicado no Diário Oficial do Estado